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O Carnaval da substância
por Luisa Duarte
Hiatos. Plural da palavra cujos significados são abertura, lacuna, intervalo. Esse é o título do trabalho que abre a exposição “Carnaval da substância” de Manoela Medeiros. Em “Hiatos” a artista intervém diretamente no espaço da galeria, descascando seções verticais da parede e inserindo à sua frente, apoiadas, barras de gesso na exata proporção do corte. Como é comum em sua obra, testemunhamos por um lado um processo de escavação e, por outro, aquele de construção. Cabe notar a sutiliza existente no ato que enxerga o vazio como produtor de sentido e faz com que o espaço, antes adormecido, acorde, respire. O gesto mínimo, mas agudo, comparece também em “Entropia suspensa”, onde uma pequena porção de areia acolhe uma igualmente diminuta quantidade de água. Se o tempo é um elemento central da pesquisa da artista, aqui este surge suspenso. A artista cristaliza o instante anterior à fusão irreversível na qual areia e água se unem ao ponto de se tornarem um só amalgama.
Vazio, arquitetura, tempo, matéria, todos os elementos presentes nas obras acima compõem a instalação “Still life”. Entra em cena, agora, o jogo cromático. Estamos diante de estruturas modulares que evocam edifícios, forjando a projeção de uma cidade imaginária feita da aproximação entre esculturas assinadas pela artista e componentes básicos usados na construção civil brasileira, tais como concreto, tijolo e cerâmica. Ao realizar a sua “natureza morta”, Medeiros nos endereça um trabalho a um só tempo escultórico e pictórico capaz de evocar um tabuleiro no qual as peças
podem ser deslocadas, movimentadas, delineando configurações inauditas. Estamos diante do DNA de uma cidade por vir cujo horizonte está em aberto. Enquanto “Still life” aponta para o campo de possibilidades contidas no futuro e faz referência a ideia de projeto contida na modernidade 2 , os demais trabalhos reunidos na exposição endereçam um olhar simultaneamente atento ao presente e
interessado na remissão ao passado. Comparece aqui a arqueologia poética que caracteriza a obra da artista desde o seu início. Se a arqueologia é a ciência que estuda vestígios materiais da presença humana com o objetivo de compreender melhor os antigos modos de vida, Medeiros faz da ciência poesia. Sai de cena a necessidade de comprovação em favor do gesto cujo fim é nos fazer imaginar o tempo já vivido. Para tanto, a artista ocupa toda uma sala na qual mesclam-se pinturas e escavações realizadas diretamente nas paredes da galeria. Estas remetem a rastros que tomam a forma de escadas, paredes, portas, como se aquele mesmo espaço já tivesse cumprido outros destinos anteriormente, desenhando o que Medeiros chama de “uma arquitetura fantasma”. As pinturas, por sua vez, podem ser vistas como prolongamentos das escavações. E vice versa.
Em “Ruína (escada)” e “Ruína (telhado)”, por exemplo, o formato das telas
incorporam o que seriam vestígios de uma arquitetura ausente, como se estivéssemos
diante dos rastros de uma empena na qual se encontram gravados restos de uma
estrutura anterior, já demolida. Há ainda os trabalhos nos quais o que parece ser pura
abstração ganhar ares de quase-paisagem, como em “Ruína (roxa)”. O ato de escavar a
tela permeada por tinta acrílica e pigmento mineral forma uma topografia acidentada,
feita de relevos, cavidades, opacidades, transparências e diferentes matizes
cromáticos.
Já a influência de um repertório próprio da arquitetura vernacular brasileira surge em “Ruína (cabocla do rio) e “Ruína (casinha)”. Inspirados em fachadas observadas em cidades do interior do país, os trabalhos trazem um registro figurativo e afetivo até então inédito na pesquisa de Medeiros. Essa nova série vem se somar ao programa de uma arqueologia poética empreendido pela artista e nos faz recordar a seguinte passagem do historiador Reinhart Koselleck: “Quem busca encontrar o cotidiano do tempo histórico deve contemplar as rugas de um rosto, ou então as cicatrizes nas quais se delineiam as marcas de um destino já vivido. Ou ainda, deve evocar na memória a presença, lado a lado, de prédios em ruínas e construções recentes, vislumbrando assim a notável transformação de estilo que empresta uma profunda dimensão temporal a uma simples fileira de casas” 3 . Ora, não é isso que nos endereça o encontro com a obra da artista? Na mão contrária de uma época que chegou a decretar o fim da História, ou seja, o fim do tempo, pois história é tempo, e assim sendo está sempre sujeito a mudanças de curso, Medeiros recorda que a história não se encerrou, mas ao contrário, está em franca disputa. E se sabemos que a chamada história oficial contem muito de ficção, cabe interrogar aquela já escrita e imaginar uma outra para o por vir. Para tanto, a artista não faz uso das grandes narrativas, mas antes escolhe descortinar as temporalidades existentes nas simples fileiras de casas, nos prédios em ruínas, nas fachadas do interior, no saber fino do fazer popular, nos cantos adormecidos dos espaços. Tudo
aquilo que no nosso passo apressado, na nossa constante desatenção, na nossa incapacidade de instaurar hiatos - aberturas, intervalos, respiros, pausas - findamos por não perceber. Manoela Medeiros, com a sua arqueologia poética, toca em uma das regiões mais sensíveis da experiência atual, aquela que clama por uma mutação aguda em nosso vínculo com o tempo.
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Poeira Varrida
por Bernardo Mosqueira
(ao meu amor)
Em 1978, uma equipe da companhia de eletricidade da Cidade do México começava sua jornada de trabalho fazendo uma escavação na região do Centro Histórico dessa gigantesca metrópole: A intenção era passar cabos subterrâneos que serviriam ao sistema do metrô. Antes que chegassem a 2 metros de profundidade, assustaram-se ao encontrar sob a terra uma enorme pedra que descobririam ter 8,5 toneladas. Era um disco com mais de 3,2 metros de diâmetro em cujo relevo, realizado no século XIV, seria reconhecida a representação de Coyolxauhqui, a deusa da Lua para a religião asteca. Alguns anos depois, a partir dessa e das muitas descobertas que viriam em seguida, o presidente mexicano fez um decreto especial que autorizou a demolição de 13 edifícios da região para que fosse realizada uma grande escavação arqueológica. Foram encontrados ali mais de 7 mil importantes objetos (muitos deles partes de antigas oferendas rituais) além - é claro - do próprio Huey Teocalli. Finalmente: o
Templo Mayor...
A arqueologia é a ciência que estuda vestígios materiais da presença humana com o objetivo de compreender melhor os antigos modos de vida. Entre a verificação e a invenção, está ligada à construção de narrativas hipotéticas sobre o passado a partir de rastros que por ventura conseguiram resistir até o presente e que foram encontrados por profissionais. Lidando com fragmentos de sociedades extintas, essa ciência ambiciona a reconstituição de processos culturais que desapareceram. Dessa maneira, a arqueologia, em si, nos mostra que as formas de viver no mundo estão em constante disputa e mutação.
A metodologia arqueológica é formada por etapas que vão desde a identificação e prospecção de um sítio até a análise dos artefatos encontrados. A escavação é certamente uma das fases mais cruciais: é o momento em que é retirada de cima do artefato toda a poeira que ali se depositou e sedimentou com o tempo. “Escavação” é justamente o nome dado pela artista carioca Manoela Medeiros (1991) para o procedimento utilizado na feitura da maior parte de sua obra realizada até hoje. Com essa técnica, a artista retira determinadas camadas da pintura da parede utilizando instrumentos precisos até chegar ao revestimento mais rígido abaixo. Normalmente, Manoela cria recortes geométricos na superfície da parede e os relaciona com objetos ou com outras formas geométricas preenchidas pelos fragmentos de tinta retirado da “escavação” anterior.
Revelando os diferentes níveis de tinta sob a superfície da parede, Manoela aponta para o caráter transitório de tudo e, por isso, para a relação entre o que se mantém e o que transforma. Na verdade, toda a produção da artista até hoje surge de um interesse profundo na relação entre o corpo, o espaço e a passagem do tempo e se realiza como abstrações resultantes de exercícios formais. Na exposição “Poeira Varrida”, sua primeira individual na Fortes D’Aloia & Gabriel e fruto do período em que esteve em residência em São Paulo, os trabalhos elaboram a experiência árida e violenta da cidade enquanto refletem sua pesquisa imagética sobre pinturas rupestres, arte pré-colombiana, cerâmicas indígenas, pintura corporal ritualística, hieróglifos,
geoglifos, fósseis etc.
Mesmo que os termos escolhidos para nomear as obras na mostra (como “Vale”, “Fronteira”, “Território” e “Declive”) sejam termos emprestados do campo da geografia, a relação entre os títulos e as demais características do trabalho (matéria, forma, técnica etc.) não formam códigos que ilustram críticas, afirmações contundentes ou soluções para o mundo em que vivemos. Se Manoela produz uma arqueologia com seu trabalho, essa é uma arqueologia intempestiva, que enuncia no presente ao invés de narrar o passado, ligada à contramemória, que insiste sobre a presença, mantém as coisas em estado de problema sem solução pré-determinada, que desenterra o vale, a fronteira, o território, e os oferece ao público confiando nas potências da paralaxe. É uma arqueologia cuja última etapa é a escavação. A análise dos vestígios não faz mais parte dos processos da artista. É fazer do público.
Por operar diretamente com o descontínuo, a arqueologia pode nos ajudar a perceber a deriva humana, pois é capaz de nos fornecer instrumentos contra a noção de um tempo único ou de uma História única associada à ideia de progresso ou evolução. Ao mesmo tempo em que os vestígios podem ser utilizados para a construção de um discurso pretensamente absoluto sobre a História, eles podem também nos apontar para o fato de que essa não é mais do que uma memória inventada - entre muitas outras que seriam possíveis.
Oswald de Andrade, uma vez tratando das formas de conseguir acessar o tempo da Idade de Ouro do Matriarcado, disse que seria necessário criar uma “ciência do vestígio errático”. O interessante é que “vestígio” vem da palavra latina que significava “pegada” e “errático” pode querer dizer “que vagueia”, “errante”. A ciência do vestígio errático seria, portanto, uma espécie de arqueologia que se debruça sobre partes sobreviventes do passado que continuam vivas, em movimento, irrefreáveis, inapreensíveis em sua completude, insolucionáveis.
Num momento em que parte da sociedade começa a reconhecer e desnaturalizar as injustiças, Manoela se esforça para não construir seu trabalho tecendo claramente discursos políticos. Em um contexto tão cheio de injustiças vividas e assinaladas, em que grande parte dos artistas tem escolhido responder às emergências do mundo apresentando ou apontando críticas, elaborações ou soluções em suas obras, Manoela cria seus trabalhos com uma espécie de ingenuidade, como se, candidamente, optasse pela inadequação ao invés do bom senso.
Manoela tentou criar um trabalho imune à contradição simplesmente por não se equilibrar sobre uma linha (sempre tão bamba quando potente) discursiva, narrativa, explicativa ou histórica. Pelo contrário: sua obra se estende por todo o espaço possível dos afetos sem orientação, se sustenta pela teia complexa formadas pela diversidade de fruições, questionamentos e elaborações.
A presente exposição se configura a partir de jogos geométricos de ritmos e rimas imperfeitas, de uma série de reflexos, repetições, distorções e rebatimentos – alguns mais claros, outros mais discretos. Nessa mostra, Manoela também experimenta pela primeira vez a construção de objetos que parecem brotar como erupções, mutações, verrugas urbanas surgidas dos materiais da cidade e da própria galeria. Nesse caso, não são testemunhas de outros tempos que nos sussurram a transitoriedade ou um outro tipo de tempo, mas é a substância e a resistência das coisas que nos apontam as disputas que envolvem o perene e o que o dinamiza. No espaço de “Poeira Varrida”, ainda sob o eco dos atos de escavação, emergem objetos de tempos e sentidos indecifráveis. O resultado é uma envolvente cartografia no hiato, cujas razões geométricas atravessam transversalmente os trabalhos e o público. Esses cruzamentos são balizas quase-visíveis de caminhos abertos, marcas que sugerem novas escavações ou futuras
erupções.
...Como a Cidade do México foi construída sobre um grande lago, hoje em dia, com o crescimento urbano acelerado e a superpopulação, há muitas regiões da cidade que estão perigosamente afundando no solo. Há localidades que já chegaram a descer mais de 12cm em apenas um ano. Porém, o Templo Mayor, por sua vez, vive a situação contrária. Ao retirarem o peso da terra que lhe comprimia com diversas camadas de colonização e urbanização desde o século XVI, o templo passou a emergir do solo: desde sua escavação, essa pirâmide, que era o centro da vida religiosa asteca, está se movendo cada vez mais para fora da terra.
Viva.
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Jusqu’à ce que l’horizon nous rejoigne
par Grégoire Prangé
En 2014 Manoela Medeiros érige un mur en coin 1 , espace rudimentaire adapté au corps qui vient s’y nicher – le sien – habitat minimal dans lequel il se tient, évolue, lentement s’y heurte, contraint, doucement détruit. Couche après couche le plâtre se détache de la structure et s’écrase sur le sol, forme d’érosion accélérée par les os, les muscles et la peau. D’archéologie inversée. Au contact de la chaire, le mur – membrane plus poreuse qu’elle ne veut bien l’admettre – devient le négatif d’une relation physique mouvementée. Ainsi marquée en creux, notre relation au monde se trouve comme inscrite dans la paroi, avec tous ses points de contact, violents ou apaisés, ses agitations et ses langueurs. De ce fait elle peut se lire, et survivre à l’instant passé.
En géologie, une couche stratigraphique marquée par divers phénomènes naturels tels qu’une éruption volcanique, un tsunami ou l’impact d’une météorite, mais également par l’accumulation de contenus fossiles, se nomme horizon. Ce même terme s’utilise en archéologie pour définir une large portion de territoire marquée par les mêmes restes, les mêmes artefacts : un morceau de temps figé dans le sol. Observer l’horizon nous permet donc de plonger dans l’histoire de la terre et de ses habitants, avec un peu de travail dans leurs vies, avec un peu de projection dans leurs rêves. Car si l’horizon cristallise le passé, il dessine aussi l’avenir.
En 2012 Manoela Medeiros explore à Lisbonne les entrailles d’un bâtiment délaissé, y dessine, y pose ses marques et en gratte la surface – à la main, le corps et la matière – qui peu à peu s’effrite et laisse apparaître du mur les multiples strates, couches de couleurs et de matières empilées. Avec ce carottage improvisé – elle parle d’excavation – c’est l’histoire du lieu qui se donne à voir, des personnes qui l’ont occupé, des histoires qu’il a accumulées, des vies qu’il a contenues, des rêves qu’il a laissé s’échapper.
En 1940, alors que le monde sombre dans la guerre, un jeune garçon fait la découverte d’une grotte aux parois peintes, non loin du château de Lascaux. L’histoire veut qu’un lapin apeuré ait entraîné dans ce lieu effacé la fougue d’un chien puis la curiosité de son maître. Après avoir retiré quelques pierres réapparaissent des formes plusieurs fois millénaires, des couleurs, des traces, rémanences de gestes et d’histoires depuis longtemps révolues. Et l’horizon se rapproche – par excavation devient présent, dans nos regards devient futur.
Manoela Medeiros explore donc à Lisbonne les entrailles d’un bâtiment délaissé. Pour elle l’expérience devient révélation, aussi bien qu’initiation : du site, elle extrait des fragments qui ensuite deviendront œuvres, de celui-là puis d’autres, au Portugal, en France et ailleurs, les mettant en proximité et par là rapprochant les histoires, les vies et les rêves oubliés. Depuis 2012 elle relie ces horizons divers 2 , créant ainsi par collage de nouvelles réalités dans l’espace et le temps, histoires chimériques dessinées pour stimuler nos imaginaires.
1 Le propre univers plié en un coin, 2014
2 Série des Continents
En 1973 à Winchester, Edward C. Harris développe une matrice visant à analyser et schématiser les séquences stratigraphiques observées dans les fouilles archéologiques. Fonctionnels, ces dessins représentent le mille-feuilles d’horizons que le temps a produit dans un territoire – et les multiples strates résultant des vies qui s’y sont succédées – la manière dont ils sont agencés, leurs points de contacts, leurs porosités. Assez naturellement, Manoela Medeiros s’intéresse à cet outil scientifique qui, d’une certaine manière, condense l’agencement des histoires, des vies et des rêves, et entre en résonnance avec bon nombre de ses œuvres.
La dimension archéologique du travail de Manoela Medeiros s’exprime parfois sur site directement. Elle travaille alors en symbiose avec le lieu qui l’accueille, avec ses composantes naturelles 3 , de ses murs révèle les strates cachées 4 – des couches de temps – les excave pour les donner à voir renouvelées 5 . En grattant ainsi les parois de l’espace d’exposition, elle crée des fenêtres sur ses vies passées, horizons mêlés dans lesquels nous sommes invités à nous plonger pour en recomposer les paysages – c’est la rencontre du territoire et de l’imaginaire.
Si le paysage est un territoire devenu image, un territoire augmenté, ou bien détourné, alors peut-être l’archéologie nous permet-elle par l’étude des sols de révéler les paysages passés, au moins partiellement. C’est ce processus, qui s’appuie sur le temps long, que Manoela Medeiros condense dans la série des Ruines, appliquant sur la toile de nombreuses couches de peintures et les excavant ensuite, grattant pour laisser apparaître sur le même plan l’accumulation de ces temporalités feintes. Procédurales 6 , ces peintures ne cherchent pas à représenter les murs vieillis de nos villes, qui nous séparent du monde extérieur et sont voués à évoluer, à subir un processus de dégradation et sans doute à disparaître, laissant la nature les recouvrir et les réintégrer à son règne – forme de retour à la terre, et de réconciliation. Elles ne cherchent pas à en imiter la surface et les histoires, mais bien plus à en donner une image, en l’incarnant à en reproduire la force et les effets. Ainsi, ces toiles sont d’une certaine manière des œuvres mises en ruine, et des ruines mises en œuvre.
En 2015, Manoela Medeiros déplace une dune de sable vers une autre à l’aide d’un tamis 7, entreprise symbolique rendue vaine par l’usage de ce contenant qui, inévitablement, laisse les grains s’écouler le long du chemin. Répétée, l’action répartit le sable entre les deux dunes, à la manière d’un grand sablier qui voyant l’écoulement du temps vient fondre les horizons. Car si l’horizon cristallise le temps, les histoires et les vies, il contient également nos rêves et ceux des autres, qui étaient là avant nous et seront là après, les utopies qui nous ont gardés en vie. Alors il peut bien reculer, l’horizon, à mesure que nous avançons il peut bien s’éloigner, du moment que nous le gardons en vue – peut-être un jour nous
rejoindra-t-il.
En 2022, l’horizon reste la perspective de Manoela Medeiros – les enfouis que nous excavons, les cachés que nous redécouvrirons, les lointains qui peut-être nous atteindrons – qui se déploie sous différentes formes dans l’espace d’exposition, qui nous est transmis bien sûr et vers lequel nous sommes invités à nous projeter. À la manière de son travail, ce texte s’est construit en strates imbriquées, à la recherche de lignes de forces et de perspectives, d’images et de paysages, d’évocations, d’intuitions ; en nuances car, comme le temps, son œuvre ne se construit pas comme un fleuve linéaire, mais se déploie en de nombreux méandres, qui s’écoulent et se croisent, s’éloignent et se rapprochent, jusqu’à ce que l’horizon les rejoigne.
3 Indice de paysage, 2015
4 Paysage limite, 2015
5 Voir par exemple Hiatus, 2015 ; Declíve, 2017 ; Frontière, 2017 ; Eclipse, 2018 ; Vão, 2021 ; etc.
6 Jusqu’à parfois devenir instructions : Instruction pour la construction d’une ruine, 2015
7 Déplacement de paysages, 2015
Grégoire Prangé
Palerme – Lectoure, 2022
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L'être Dissout Dans Le Monde
par Théo-Mario Coppola
Les recherches de Manoela Medeiros se concentrent sur les techniques de l’architecture envisagées comme des déplacements, la matérialisation des cycles et des écosystèmes, la construction d’une réalité complexe au sein de laquelle la distinction entre nature et culture disparaît au profit d’un dualisme vitaliste. L’humain n’est pas exclu du monde ou en contradiction avec lui. Il est le monde. Ses décisions, ses gestes et ses actions, en relation avec les autres êtres dessinent les limites de sa condition. Les recherches de Manoela Medeiros s’étendent de l’archéologie contemporaine à l’écologie solidaire, de la poésie de Manoel de Barros au perspectivisme amérindien de Eduardo Viveiro de Castro.
Action archéologique
L’archéologie n’est pas envisagée comme un thème mais comme une méthode de travail. Elle est une action, perçue et projetée dans un registre politique. Manoela Medeiros excave, explore, évide la matière urbaine. Les parois des immeubles, les murs intérieurs des espaces d’exposition ne s’opposent plus. Ce sont les mêmes supports de l’expérimentation. Ce qui est extrait de l’espace urbain se prolonge par des combinaisons de strates blanchâtres ou bigarrées, comme autant de façades superposées. Manoela Medeiros retient que « l’Histoire n’existe que parce qu’on la considère comme un objet discutable qui évolue avec l’état des connaissances actuelles ». L’archéologie apparaît ainsi pour elle, avec la fonction primordiale d’informer les conditions d’existence au présent. Elle est ce qui reste, ce qui perdure et ce qui transforme notre projection dans le monde. En regardant les strates révélées du passé, nous contemplons les variations de l’interprétation de notre propre quotidien. Manoela Medeiros ne contemple pas l’esthétique des dispositifs de l’archéologie dans une perspective rhétorique. Elle l’investie comme une action. Les excavations des murs et des parois supposent à la fois le geste performatif et l’installation qui restitue le processus de révélation. Manoela Medeiros invite ainsi l’espace du dehors à l’intérieur du white cube. De la même manière, ces excavations ouvrent des passages symboliques sur le passé des espaces clos. Derrière la peinture blanche, lisse, d’apparence propre et immuable, des strates successives de couleurs, de textures, de réalités passées s’additionnent et remontent à la surface. Tout est chargé des anecdotes et des réalités d’un passé largement inconnu. L’archéologie ne fige pas. Elle permet au contraire de modifier, de changer, de transformer la relation à l’espace. Pour Manoela, elle ne doit pas être rhétorique mais au contraire être mobilisée dans le sens d’une stratégie inclusive.
La rue, interceptée
L’œuvre de Manoela Medeiros s’inscrit dans plusieurs courants de l’art contemporain au sein desquels, sa position perturbe les vocabulaires et les registres. Inclusive, elle arbitre entre l’héritage de l’art conceptuel, le formalisme de la sculpture des années 1970 au Brésil et l’émancipation politique dans une perspective critique. L’intelligence limpide et sensualité des matières assemblées s’agencent dans des représentations urbaines. Le regard intercepte les ricochets des hallucinations de la rue. Ce que l’on voit, ce que l’on regarde vraiment, avec l’attention du passant curieux est un signe, une adresse. Ces micro-indices sont ensuite transfigurés dans les installations, les excavations, les peintures, les collages, les assemblages, prolongeant en fiction un monde dense et cosmogonique. Manoela vit entre l’Europe et le Brésil. Elle explore dans ses œuvres les réalités culturelles et sociales de la vie urbaine de continents éloignés et en connexion. Les registres esthétiques cohabitent et interagissent. La circulation entre les œuvres et les séries est marquée par un usage précis de matériaux et par la composition de motifs évocateurs d’un formalisme tenace.
Le monde, avec nous et en nous
Le cosmos tient une place centrale. Il est le point de départ à une réflexion sur l’anthropocentrisme, l’ambiguïté de la pensée cartésienne, le renversement des préceptes de la pensée moderne au profit d’une mise en relation des œuvres avec une dynamique de circulation, celle des cycles, des recommencements, des saisons nouvelles et répétées. « Je ne crois pas que nous existions dans le monde comme des êtres en plus, comme des éléments supplémentaires. Nous sommes ici, au même titre que les autres éléments. Nous n’existons pas plus ou moins. Nous sommes comme les choses qui nous entourent ». Les êtres, humains et non humains ne sont pas des surplus. Ils contiennent en eux les indices du monde et se déversent réciproquement dans un environnement avec lequel. Nous, humains, ne sommes pas non plus élevés à un rang plus élevé. Tout tient une place semblable, une présence égale dans l’œuvre de Manoela Medeiros. L’artiste envisage le monde dans l’interrelation permanente et la réciprocité des échanges, des énergies, des formes. L’être, humain et non humain, existe en lui et en dehors de lui-même. Le monde se disperse, se dilate, s’étend, se répand en nous, comme nous le traversons et le modifions. Plus nous accumulons les récits constitutifs de notre histoire personnelle, plus nous tentons de caractériser ce qui permet de créer des liens. Pour Manoela, les liens doivent être observés indépendamment de notre volonté de créer une cohérence entre notre histoire personnelle et le monde. L’artiste présente plutôt des versions alternatives de notre condition en réinvestissant l’aléa, le cycle, la forme comme autant de repères possibles dans la construction d’une projection personnelle dans le monde.
Ce que le corps peut, ce que le corps veut
Le corps, ensemble de mots et de gestes frémit en relation à la fragilité d’un espace transitoire. Le plâtre peint, adossé à son support grillagé rassemble le geste performatif et la sculpturalité urbaine dans une formalisation subtile. Un autre espace de l’exposition est investi par la présence singulière d’une sculpture composée d’un assemblage de piques anti-pigeon dont les formes et les arrêtes rappellent par analogie les rames d’une plante. Cette circulation des formes, comme autant d’éléments représentatifs de la corporéité des espaces et des gestes s’élance dans le mouvement d’un cycle liquide dans une installation qui en est le pendant. Le corps, contraint ou animé par le désir vital est dessiné par les analogies et les rapports de force entre l’élément culturel et le mouvement naturel, dans la perspective d’un dépassement plus grand encore. Les paroles, comme les gestes, sont, comme l’évoquerait de Barros, sans limites. Cette expansion infinie des choses, prises et vues dans leur état initial et modelés dans des espaces transitoires projette l’individu dans une poésie pratique, celle du déplacement de l’être dans l’être-monde.
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Concerto a
céu aberto
por Manoela Medeiros
[PT]
A janela é uma entrada transparente. É uma abertura numa parede de matéria que deixa entrar o ar, a luz da lua e do sol, as cores do mundo, a escuridão da noite. A janela é onde se encontram e se cruzam fora e dentro, unidos dois mundo e os seus elementos. O vento estremece o vidro da janela. Os riscos das gotas de chuvas. Passando, podemos ver através da janela uma cena doméstica íntima. À mesma janela, outra pessoa olha para fora.
A palavra inglesa “window” (janela) deriva do islandês antigo vindr, , e auga, . O olho-vento era “originalmente um mero buraco na parede protegido por ramos ou uma cortina exposto ao vento”(Barnhart, 883). Ao longo dos séculos a abertura da parede foi protegida ou enchida com mármore, alabastro, papel de arroz ou, por vezes, finos painéis de mica como substitutos do vidro. Quando começaram a abrir e fechar, as janelas contribuíram para a regulação do calor, da luz e do ar e adquiriram o significado de um intervalo de tempo no qual algo pode ocorrer.
Na orquestra "Concerto a céu aberto", cada trabalho é como uma janela que conecta o ambiente exterior e interior criando novas imagens ressonantes no espaço.
[EN]
The window is a transparent entrance. It’s an opening on a wall of matter that lets the air in, the light of the moon and the sun, the colours of the work, the darkness of the night. The window is where two worlds and their elements meet and cross, outside and inside. The wind shudders the glass of the window. The scratches of the raindrops. Passing by, we can see through the window an intimate domestic scene. By the same window, another person looks outside.
The English word, “window”, derives from the ancient Icelandic vindr, , e auga, . The eye-wind was “originally a mere hole on the wall protected by branches or a curtain exposed to the wind” (Barnhart, 883). Throughout the centu- ries, the opening of the wall was protected or filled with marble, alabaster, rice paper or, sometimes, thin panels of mica as substitutes of glass. When the windows started to open and to close, it contributed to a regulation of heat, light and air, and gained the meaning of a time interval in which something may occur.
In the orchestra of “Concerto a céu aberto” [open air concert], each work is like a window that connects the exterior and interior environment creating new images that resonate in space.
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Analogies Vivantes
par Alicia Knock
Manoela Medeiros conçoit pour la vitrine un paysage mis en abimes: elle en excave patiemment les murs et les mémoires tout en apposant de nouvelles couches de couleurs. Passé et futur antérieur se mêlent tandis qu'un paysage apparait: lune-soleil-éclipse, ombres portées et reportées, jeux de formes et de langage se confondent en un hiatus éclaté. Dans ce geste de dissolution et de révélation, une nouvelle hiérarchie se forme: le cube de la vitrine, la ville et le jardin du cloitre imaginé s'entrecroisent dans un jeu d'analogies formelles et d'associations libres. La lune d'une nuit anticipée s'imprime sur les pavés éclairés des ombres prélevées du jour..une fiction spatio temporelle s'écrit doucement: vision "avec un grain de sable" (Wislawa Szymborska) entre lumière, poussière, envol de la vision ou sa disparition. La vitrine est traitée comme une fenêtre transitionnelle vers un monde d'équivalences abstraites qui prolongent et trompent l'œil: ruines neuves où se révèle un motif archaïque ou la persistance inaperçue d'une forme à travers les couches de poussières devenues matière de regards. Espace de projection de soi comme de la ville, de la nature imaginée, espace trouble où le sol et la fenêtre se toisent dans une perspective continue et hétérogène : chambre claire de formes immémoriales et à peine nées, que nos regards soufflent et recomposent, selon le temps qu'il fait.
"Il dessinait partout des fenêtres.
Sur les murs trop hauts,
sur les murs trop bas,
sur les parois obtuses, dans les coins,
dans l’air et jusque sur les plafonds.
Il dessinait des fenêtres comme s’il dessinait des oiseaux.
Sur le sol, sur les nuits [...]
Il dessinait des fenêtres jusque sur les portes.
Mais jamais il ne dessina une porte.
Il ne voulait ni entrer ni sortir.
Il savait que cela ne se peut.
Il voulait seulement voir : voir.
Il dessinait des fenêtres.
Partout."
Roberto Juarroz – Douzième poésie verticale (Duodécima poesía vertical, 1991)
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L’Architecture D’Aujourd’hui Magazine
Interview with Manoela Medeiros
1.
Ce qui nous a notamment attiré, c’est la relation entre l’architecture/la construction/la matière et l’installation artistique. Pourriez-vous me raconter votre relation personnelle et professionnelle à l’architecture et à l’art ?
Arriver dans un lieu les mains vides et créer a partir de cet espace est une chose qui m’intéresse.
Chaque espace est chargé d’une histoire et d’intentions. Pour cette raison l’architecture de l’espace d’exposition, la forme selon laquelle il est construit, la lumière qui entre finissent par prendre une nouvelle signification durant mon processus de travail. Je cherche à mélanger les deux, de manière à ce que le public ne sache pas ce qui est oeuvre et ce qui est espace.
2.
Avez-vous déjà collaboré avec des architectes ? Est-ce quelque chose qui vous attire ?
Non je n’ai jamais eu cet opportunité. Mais j’ai des projets qui s’étendent à la construction d’espaces plus grands où un dialogue avec un architecte serait effectivement enrichissant.
3.
Quels vos sujets de prédilection et les messages que vous souhaitez véhiculer à travers vos oeuvres ? Par exemple avec Paysage limite (2015) ou Hémisphère(2016) ?
Je préfère ne pas donner de réponses ou messages spécifiques a partir de mon travail, mais plutôt suggérer de multiples chemins et histoires.
Paysage limite et Hémisphère par exemple se rapportent à des questions liées à l’idée de construction et déconstruction. Dans ces oeuvres, la forme/méthode utilisée pour la construction du travail créent des significations importantes pour celui-ci.
Paysage limite utilise la ligne tracée par l’angle du mur comme une espèce de ligne d’horizon située à la verticale et qui séparerait passé/présent/futur. Je creuse la superficie du côté droit du mur et du côté gauche j’utilise les fragments issus de cette action antérieure (‘excavation’) pour une supposée tentative de reconstruction du même périmètre. Ces actions présentes dans le processus de travail me projettent de manière plus ample dans la condition humaine. Nous naissons dans un monde que nous ne construisons pas. Nous réalisons au quotidien des constructions ou réorganisations de nouvelles ruines à partir d’anciennes ruines qui déjà ne nous servent plus.
Le travail Hémisphère possède la même forme/méthode de construction. Cependant
la figuration se révèle une donnée assez imposante dans ce travail. L’image de l’Amérique du Sud creusée dans le mur et la reconstruction de l’Amérique du Nord sur le sol à partir des fragments tirés de l’opération d’excavation créent une relation de dépendance ciclique où les questions liées à qui est l’excavé et qui est fragmenté se trouvent quasi-indissociables.
3.
Vous dites “À la croisée de différents médias mon travail utilise essentiellement la sculpture, la peinture, la performance et les installations”. Pourriez-vous m’indiquer la manière dont vous travaillez habituellement ?
Les travaux possèdent leur liberté propre pour exister dans le monde. Pour cela je cherche à ne pas limiter une idée à un médium. Je préfère laisse un dialogue toujours ouvert.
4.
Que représente, pour vous, l’exposition annuelle Jeune Création et qu’en attendez-vous ?
L’exposition Jeune Création est une initiative très forte du fait qu’il s’agit d’un projet fait par des artistes pour des artistes.
C’est important que nous, artistes soyons constamment impliqués dans la création le cadre et la scène artistique que nous pensons pertinente. Sinon nous pouvons nous retrouver dans un système dans lequel nous nous ne reconnaisons pas.
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Catalog 62e Salon de Montrouge
par Matthieu Lelièvre
Les oeuvres de Manoela Medeiros frappent par la subtilité de leur rapport à l’espace dont elles semblent être les plaies poétiques et mélancoliques. Loin d’un esprit pop de l’arrachage des affiches et des calembours visuels créés par la juxtaposition des lambeaux d’affiches de Mimmo Rotella ou de Jacques de la Villeglé, les fragments arrachés et rassemblés sur ces châssis de plâtre sont de réels fragments de murs, vestiges de murs collectés dans des bâtiments abandonnés. Prélèvement ou biopsie du gravât, cette archéologie de l’habitat, exploite la poussière et le fragment, mettant en évidence et simultanément la présence et l’absence des occupants successifs.
Sa pratique artistique applique parfois cette méthode de l’écaillage à des formes et des éléments géométriques en dialogue directe avec un angle, une surface, ou encore un recoin d’une architecture. Ces « déplacement d’espace » semblent vouloir matérialiser une méthode de collecte des couches de poussières accumulées par le temps.
Le spectateur est inconsciemment familier de cette tendance à vouloir sauver les traces du passé, indépendamment de la disparition inéluctable et programmée du bâti. Le travail de Manoela Medeiros n’est d’ailleurs pas sans rappeler la dépose des fresques archéologiques, et les teintes de ses compositions accidentelles, la beauté fanée des luxuriantes compositions antiques. Les peintures murales des villas romaines rassemblées dans les musées ne sont pas même l’ombre de ce qu’elles ont été et la dimension archéologique du travail de Manoela Medeiros semble relever d’une même tendance performative à vouloir combattre le temps : une démarche fastidieuse bien qu’invisible dont l’absurde semble en renforcer la force poétique. Le champ lexical de la ruine est d’ailleurs celui que l’artiste privilégie pour titrer ses oeuvres. « hiatus » ou « Déplacement d’espace » mettent en évidence la notion d’absence. L’action semble ici située dans un temps qui succède à l’humanité ou encore celui d’une architecture résiduelle appelée elle aussi à disparaitre.
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Falling Walls
par Emmanuelle Oddo
C’est au coeur de la poétique de la ruine que l’artiste brésilienne Manoela Medeiros a ancré sa pratique.
Telle une ode à l’architecture résiduelle, son oeuvre multiple - sculptures, peintures, installations, performances - entretient un rapport étroit à l’espace visible et invisible. Dialoguant avec le bâtit, l’artiste pénètre l’histoire des lieux et le silence des murs pour révéler ce qu’ils ont de plus sensible.
Son travail témoigne d’un équilibre entre construction et dé-construction : les fragments de murs ou de plâtre sont, selon le procédé créatif de l’artiste, commencement ou fin, soustraction ou accumulation. Dans sa série « Ruine », ils reposent au sol comme les vestiges ou témoins d’un geste destructeur, à travers lequel Manoela est venue écailler sa toile pour révéler des plaies accidentelles qui mettent en scène l’absence ou l’abandon. D’autres fois, il s’agit au contraire de reconstruire à partir des débris, dans une volonté de sauver le passé. Chaque découverte d’un lieu abandonné devient alors prétexte à la collection de fragments de murs, dont les couleurs fanées puis rassemblées sur le chassis de l’artiste évoquent les différentes périodes et occupants qui ont marqué les lieux, dessinant une véritable archéologie de nos habitats.
Un rapport à la ruine qui se lit également à travers les couleurs fanées employées, qui racontent l’altération de la matière par le temps, ainsi qu’à travers l’économie de moyens dont fait preuve Manoela Medeiros : les matériaux auxquels elle a recourt sont exclusivement issus de l’univers du chantier, mais la manière dont ils sont ici employés permet de dépasser leur trivialité pour révéler tout leur potentiel esthétique. En témoigne l’installation « Nature Morte » : ici, à l’aide de quelques briques, Manoela érige le spectacle d’un paysage résiduel, le squelette d’anciens bâtiments brutalistes qui auraient dans leur chute, perdu toute la froideur de leur verticalité et leur rudesse pour laisser place à l’harmonie formelle sur laquelle reposait leur structure.
A travers l’ensemble de ses oeuvres, Manoela Medeiros renvoie finalement la ruine à son état le plus vivant, lorsque, mise à nue, elle dialogue avec le jour ou la pluie. C’est cette poésie de l’espace, ce ballet entre les angles, les recoins et les ouvertures, dont l’artiste rend également compte à travers son installations in-situ, sculptant à même les murs des lignes suggérées par la lumière, étendues éclatantes ou hiatus imperceptibles qu’il s’agissait de déceler.
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Deslocamento de Paisagem
por Manoela Medeiros, 2015
A performance “Deslocamento de paisagem ou Travessia” acontece em uma paisagem contruída. Duas dunas de areia onde um corpo movimenta-se deslocando pouco a pouco, com a ajuda de uma peneira, um punhado de superfície arenosa até a outra duna localizada ao final do sala.
Ao utilizar a peneira para esse deslocamento cria-se imediatamente uma ação iconclusa, falha, de jogo constante entre espaço, corpo e movimento. A paneira vira uma espécie de ampulheta que constantemente anuncia que o tempo passou e é necessário retornar. Tornando visível o desenho desse caminho-travessia, onde a cada vez que damos dez passos em relação ao horizonte ele se afasta mais dez passos. Um constante ir e vir incessante onde é necessário retornar ao passado, mesmo que um passado já fugido com menos areia, para caminhar em busca da construção desse novo mundo futuro.
Entretanto, é somente nessa travessia que o corpo depara-se com sua situação de permanecer em deslocamento e não chegar. Assim o horizonte passa a residir no estar e o movimento deixa de fluir na expectativa permanecendo na experiência. Sendo assim habita-se o caminho.
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Manoela Medeiros
por Maria Catarina Duncan
Catálogo Abre Alas | A Gentil Carioca
Os trabalhos da artista Manoela Medeiros trazem á flor da pele novas construções sobre tempo e espaço. Constantemente nos relacionamos com esses binômio, somos parte dele. No entanto, o que o trabalho sugere é uma possível desconstrução do tempo que contamos, um tempo que não é marcado por relógios mas simplesmente é. O espaço que se mostra moldável quando a forma que temos, o corpo que ocupamos são compreendidos como limites permeáveis. A apropriação e reconsideração desses conceitos conduzem uma artista que preza pela impermanência, desvendando um constante vir a ser.
Manoela sabe se despir de convenções, permitindo um jogo aberto, em que mergulha com o corpo em um canto engessado e o quebra. Desconstrói assim os moldes, os limites duros e concretos e apresenta uma nova ordem, construída sobre uma base de areia, ar, terra e tempo.
Traçando novos contornos para aquilo que antes parecia fixo. Cada acontecimento nos é dado como sensação em um instante de presença, pontual e fragmentado. Mesmo dentro das linguagens artísticas que se apropria; Pintura, escultura, desenhos e instalações se mesclam e se turvam, se complementam e esquecem suas constituições. Seu norte é partir da ação do corpo, da impossibilidade de ser rígido diante da passagem do tempo e espaço, tudo se esvaece.
A ficção é fundamental para permitir que esses caminhos se abram, no processo de mistificação do estabelecido tudo pode ser questionado. Quem não se movimenta não sabe das correntes que o prendem. A capacidade de abraçar o questionamento e a ilusão reflete em uma aceitação sobre as passagens que nos movimenta. É preciso desligar os modos automáticos e compreender o valor da curiosidade, da sobreposição e das múltiplas verdades.
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Descontruir para construir
por Victor Gorgulho, 2015
Manoela Medeiros delimita o perímetro de quatro painéis nas paredes da casamata e, ao longo de 14dias, pinta‐os, com camadas uniformes de tinta sobrepostas umas às outras. “Instruções para construção de uma ruína” é, antes de qualquer outra coisa, um processo que a artista compartilha com o público que circula pelo espaço, podendo acompanhar a evolução da proposta, duranteos 27 dias da exposição. Após repousar cada uma das quatro camadas de tinta (amarela, verde, azul e vermelha dividindo o espaço com a massa branca), a artista começa a escavar seus “quadros”, dando início ao seu rigoroso regime de desconstrução.
Operando um balanço preciso entre questões de ordem visual e outras de origem performática, “Instruções” apresenta-se como um experimento que versa sobre tempo, espaço e corpo. Dos três elementos, é o primeiro o que salta na frente e revela‐se a espinha dorsal da obra de Manoela. Ao acelerar o processo natural da formação de uma ruína, a artista não só manipula o tempo como o joga em suspensão: embaralha a ordem de passado, presente e futuro. Ao escavar, Manoela dá vida a eloquentes cicatrizes na parede, que, se deixadas à mercê do tempo, demorariam anos para tomar forma por conta própria.
Há, no método, um diálogo constante com as paredes do cubo branco. Ao serem descascadas, são elas que comunicam, em sua silenciosa destruição, seus pontos mais frágeis, suas craqueladas inevitáveis, suas cores e texturas próprias. Ainda que esta não seja a primeira vez que a jovem artista tenha interferido no espaço da galeria (a primeira foi com “O próprio universo dobrado a um canto”, em que adicionou um canto ao espaço), esta é sua intervenção mais direta, sua modificação mais substancial. São pequenas e delicadas escolhas que guiam, certamente, a mão da artista ao investigar a parede; no entanto, é a voz da parede quem por vezes direcional o resultado da obra. Neste jogo, a artista e as três paredes da galeria são membros de pesos equilibrados. É necessário que um escute ao outro, pede-se delicadeza de ambas as partes.
Na contramão de uma era de visibilidades extremas, Manoela torna protagonistas do espaço expositivo suas ruínas, elementos comumente associados à destruição, a aquilo que já é velho, ao que é abandonado. É através do encadeamento de suas operações que a artista empresta beleza ao resto, aos ruídos emitidos pelas paredes que são gentilmente destruídas. Construir em processo reverso é, em “Instruções para construção de uma ruína”, um gesto que revela-se um simulacro da passagem do tempo. A artista torna palpável a passagem deste, deixa‐a marcada na matéria exposta ao público, tensiona-o com o espaço, em uma dobra irreversível. Repousam no chão da galeria apenas os restos das paredes que tiveram a chance de respirar, ao menos uma vez.
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O próprio universo dobrado a um canto
por Laura Cosenday
Fichário | Casamata, 2014
O canto foi construído por suas próprias mãos na semana prévia de montagem, revestido em gesso com cuidado para que cada rachadura que surgisse fosse reforçada, para garantir sua resistência.
Um lugar íntimo construído para si, o canto é um refúgio para o qual Manoela Medeiros volta seu rosto.
Ele surge como uma quina a mais entre as paredes da casamata, uma interferência em sua arquitetura, no eixo em que o espaço se curva para a esquerda. O objeto ganha presença por si só ao ser colocado nesta posição, como um monolito branco, gerando uma sutil estranheza para quem olha de fora desde a porta. Sua face vazada está orientada para o interior, de forma que o público é forçado a se posicionar no fundo do espaço para ver a ação. Mas Manoela está acolhida ou acuada nesta posição? Ela começa uma sequência de movimentos, que é acelerada progressivamente na medida em que se repete.
O ritmo cresce, seu corpo se aquece e emana calor – parece ocupar o espaço inteiro mesmo sem ultrapassar os limites do ângulo construído. O movimento ganha potência de tal modo que a estrutura por vezes parece tombar com o peso de seu corpo. Ela se debate contra o canto com insistência, no que até pode parecer uma reação à presença do público. Quanto mais se quebra, mais forte fica a vontade de persistir. Ao mesmo tempo, a sensação é de não querer sair deste canto. Vemos a exaustão em seu rosto mesmo que seu olhar não se encontre com o nosso, concentrada em seu próprio transe, ofegante, sua expressão se confunde com desespero. Para onde ir? O instante se estende até onde dura sua obstinação, até onde o público permanecer, até onde a parede aguentar. E, subitamente, se suspende no seu ápice.
O que resta deste canto fica no espaço e os pedaços craquelados permanecem espalhados pelo chão. Manoela volta no dia seguinte e retira as mantas de tecido que sustentavam as camadas de gesso. Fragmentos resistem ainda grudados nessas telas, que são então afixadas nas paredes do espaço expositivo. Os resquícios de uma luta para sair da própria pele ficam à mostra. Sustentar para depois destruir, um ciclo que dá sua volta numa mesma ação.